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Autonomia e resultados: a opinião de uma professora do Distrito Federal sobre o ensino estruturado

Com 35 anos de carreira em escolas públicas e privadas, a professora Isabelmile não tem dúvida: o sistema de ensino estruturado é o melhor método para alfabetização que conheceu – e praticou – na vida docente.

Professora Isabelmile com seus alunos de 1º ano (2019) na Escola Classe 111, em Samambaia-DF


Quando o Instituto Raiar iniciou a parceria com a Escola Classe 111, em Samambaia, no Distrito Federal, o índice de crianças alfabetizadas ao final do primeiro ano passou de 41% para 82%. Em 2019, após o terceiro ano da implantação do sistema de ensino estruturado, 92% dos alunos já liam satisfatoriamente e 79% dominavam as habilidades esperadas de matemática ao final do 1º ano. A professora Isabelmile Costa Militão Carneiro, que atua como docente há 35 anos, conheceu o projeto da EC 111 no ano passado e se apaixonou, ainda que não imediatamente.


Ela, que se diz uma apaixonada pela profissão, teve certa resistência no início. “Escolhi ser professora porque me apaixonei pela profissão, a ponto de chorar, muitas vezes, ao ver as crianças lendo”, conta. “Depois que minhas impressões iniciais sobre o projeto da escola foram cessadas, tive a oportunidade de conhecer o melhor sistema pedagógico da minha vida.” Leia a entrevista com Isabelmile na íntegra e conheça mais sobre o método que será um recurso valioso para assegurar a alfabetização, ainda mais no contexto pós-pandemia.


Você tem 35 anos de experiência em salas de aula. Como resume sua trajetória docente?


Atuo na rede pública desde os anos 2000 e passei por alguns cargos: diretora de escola, subsecretária, coordenadora. O que gosto mesmo é de dar aula e ser professora, mas essas experiências me permitiram ter uma visão bem ampla da educação. Também trabalhei 18 anos em escolas privadas, onde percebi que há uma tendência de maior cuidado com o professor, assim como os pais tendem a ser mais exigentes, pois fazem um investimento e querem um retorno. A rede pública também tem essa preocupação, mas não consegue alcançá-la, muitas vezes.


Até 2019, você não havia trabalhado com um sistema estruturado. Qual foi sua primeira impressão sobre o ensino ao chegar na EC 111?


Estranhamento. Ao chegar soube que a escola trabalhava com o projeto e me interessei porque me interesso por coisas novas. Quando participei do primeiro encontro, lembro de estar numa sala, olhar para uma grade colorida que havia no lado de fora e pensar que aquilo poderia ser uma forma de controle ao meu trabalho, mas essa impressão não durou. Logo identifiquei que o projeto tinha tudo que eu via nos cursos, a preocupação com a alfabetização e a atenção à consciência fonêmica e à consciência fonológica.


Quanto tempo durou esse processo e o que a fez mudar de opinião?


Dois meses. Inicialmente eu fiquei em dúvida, mas, ao final do primeiro bimestre, já estava completamente apaixonada. O planejamento foi o principal responsável, pois a forma como tudo é muito organizado, os objetivos, a riqueza do currículo, tudo isso dá um norte ao professor. E os resultados também! Porque a gente vê rapidamente o desenvolvimento dos alunos. Durante todos esses anos que leciono a maior tristeza é trabalhar, trabalhar e não ter retorno completo. Com o ensino estruturado, a gente já tem retorno desde o primeiro bimestre. Isso foi uma luz pra mim, passei a me dedicar mais, sempre colocando a minha identidade, planejando as aulas e escolhendo a melhor forma de trabalhar aquele tema.


Algumas pessoas que não vivenciaram o ensino estruturado podem achar, inicialmente, que o método é engessado e reduz a autonomia do professor. Você sentiu isso em algum momento?


Não acho o projeto engessado nem que tira a autonomia – tanto que eu mantive a minha, elaborando as minhas técnicas para trabalhar em sala de aula de acordo com o que era proposto. Se a gente for ver, qualquer currículo pode ser taxado de engessado, mas é um guia, um norte! O projeto trabalha os conteúdos, que são brilhantes; e orienta sobre como introduzir, mas sempre temos margem para usar a criatividade.


Sabemos que qualquer mudança, mesmo que positiva, traz desafios. Quais foram os seus?


No começo eu fiquei escabelada, porque exige muita dedicação. Precisei estudar muito, mas contamos com o apoio dos coordenadores. Mas em um mês já estava adaptada. Aí vêm os desafios da sala de aula. Tinha um aluno do 1º ano com autismo que chegou à sala sem falar, ele quebrava tudo, fugia. O planejamento, nesse sentido, foi muito bom. Ele gostava muito dos fantoches Alfa e Beto, quando eu usava conseguia fazer ele se concentrar. Com o método fônico ele começou a falar e depois ler, veio um grande interesse por matemática – até consumiu o livro antes de todos! Digo que é um desafio porque é uma questão comum em todas as escolas. Eu trabalhei muito com crianças especiais e, muitas vezes, eles não leem no final do 1º nem do 2º ano, somente no 3º ano. Com o ensino estruturado conseguimos alfabetizá-lo no mesmo tempo que as demais crianças. Digo que se eu tivesse conhecido o método no início da minha carreira teria tido muito menos sofrimento.


A implantação do ensino estruturado prevê processos de gestão pedagógica para apoio ao professor. Como foi para você trabalhar nesse modelo com a equipe de gestão pedagógica?


Surpreendente e gratificante. Quando fui diretora trabalhava muito preocupada com a área pedagógica, mas sei que tem tantas outras questões na educação... sobretudo a parte administrativa, que acaba sobrepondo o pedagógico em alguns casos. Mas o projeto faz o contrário: envolve o gestor de uma forma na área pedagógica, que todos trabalhamos em conjunto. Todos são envolvidos, do porteiro ao diretor.


A alfabetização no tempo certo é uma prioridade para o desenvolvimento da criança. Para alcançar esse objetivo é necessário ter um diagnóstico e acompanhar o desempenho de cada aluno. Quando você verificou os primeiros resultados – e como foi esse momento?


Foi maravilhoso, porque chega o final do ano e, por mais que a gente trabalhe, eu particularmente, antes do ensino estruturado, passava algumas noites sem dormir, pois sabia que teve determinado aluno que não conseguiu atingir o esperado, outro que não aprendeu tanto quanto poderia, mas não era possível mensurar de fato quantos – e porquê – não estão bem. Como o ensino estruturado vemos os resultados já no primeiro bimestre, sabemos o que precisamos fazer. Eu via o que precisava melhorar, quais alunos necessitavam de mais suporte, assim todos podem avançar, considerando as suas particularidades.


Isabelmile e professores da EC 111 com turma de 1º ano

“Durante todos esses anos que leciono a maior tristeza é trabalhar, trabalhar e não ter retorno completo. Com o ensino estruturado, a gente já tem retorno desde o primeiro bimestre.”






Em sua opinião, quais são os ganhos da utilização de um sistema estruturado para a vida das crianças? E dos professores?


Todos os países deveriam investir nesses primeiros anos de vida escolar e o método utilizado na EC 111 dá base pra criança. O suporte, a base que ela ganha é fundamental para seguir em frente, avançando em sua trajetória escolar. E, como professora, digo sem dúvida alguma que foi o melhor método da minha vida nesses 35 anos de trabalho. Ao final do ano fui pra casa com a consciência tranquila sabendo que não deixei nada para trás, resgatei todos os alunos e isso é especialmente importante quando trabalhamos em um local extremamente desigual, em que a educação é a porta para uma mudança de futuro.


Qual “recado” você daria aos professores que, assim como você em 2019, estarão em 2021 iniciando o trabalho com o ensino estruturado?


Diria que não sintam medo, enfrentem a insegurança e acreditem porque é muito bom mesmo. Estou prestes a me aposentar e agradeço a Deus pela oportunidade de encerrar minha carreira conhecendo esse método. Sinto-me premiada, pois nesses 35 anos vi vários projetos, mas esse foi o melhor que conheci.


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